Ainda não deu pra mensurar o tamanho do estrago disso tudo.
Na verdade é tanta coisa que até fica difícil organizar as ideias...
Foi como se eu tivesse dormindo tendo um dos piores pesadelos da minha
vida.
Foi de uma sincronia, que de tão perfeita foi cruel, porque eu não
tive como escapar dessa armadilha. Armadilha sim, porque parece que foi
planejado um final de semana de horrores, que se eu fizesse ideia de alguma
coisa teria ficado em casa. Protegida.
Já tava sendo uma aventura só o fato de passar pela sua casa. Várias
vezes eu pensei, se eu já estava preparada pra me deparar com todas aquelas
lembranças. Mas eu pensava: o que pode me acontecer dentro de um ônibus? Não
veria ninguém da sua família. E nem te veria, você estava na minha terra. Eu
não tinha com o que me preocupar. Eu só
sofreria por lembranças mesmo. E foi o que aconteceu. Tentei dormir, mas tava
tudo muito igual com a outra vez que me aventurei indo até lá. A mesma mala, o
mesmo ônibus. O mesmo sol...
Eu iria ficar três dias fora.
Iria conhecer um lugar que queria muito. As coisas estavam indo bem e
eu só pensava nas tantas vezes que pensamos em ir lá juntos ou quantas vezes
desejei ver um show de Fábio Carneirinho com você, que me apresentou suas
músicas. Planos que nunca deram certo, afinal...
Uma cidadezinha linda. Pequena. Com um centro histórico lindo. Eu
sempre roubando as histórias dos outros lugares...
Eu estava bem.
Tem lugares que você vai e se sente protegido de algumas lembranças.
Esse não era um deles, porque tava tão pertinho do seu canto. Mas nunca passou
pela minha cabeça, nem a mais remota das ideias, encontrar você por lá. Acho
que se tivesse pensado isso não teria ido. Ou pelo menos tinha me preparado
“para o que der e vier”. O que também não aconteceu.
Depois de um dia cansativo, no finalzinho dele, há
uma distancia de alguns metros, eu te vi. Pareceu meio surreal, ou alguma
visagem, eu realmente estava muito cansada. Te vi de dentro de uma loja, no
centro. Mas não tinha certeza se era mesmo você. Ultimamente sempre encontrava
gente parecida com você. Com uma camisa do São Paulo, talvez bebendo alguma
coisa, não tenho certeza. Olhei primeiro para camisa, depois vi melhor seu
corpo... mal vi seu rosto...as coisas se encaixavam. Mas era muita
coincidência, meu Deus.
Me aproximando
da vitrine, pra ter certeza (eu precisava ter certeza de que não estava
alucinando), vi seu tio, e acho até que me viu também.
Me senti atordoada. Sem chão. Sem ar. Meu coração
quase saiu pela boca. E ninguém mais te viu. Chamei outra pessoa, porque eu
poderia estar mesmo tendo uma fantasia, mas você sumiu na rua, antes que alguém
mais pudesse ter te visto. Então ficou assim, na dúvida. Pra mim não. Eu tinha
certeza que era você.
Tive que sentar e pensar o que era que você estava
fazendo ali. Então lembrei que a faculdade estava em greve. E que você tem um
tio que mora lá. Então eu pensei: o que eu tô fazendo aqui? Por que não pensei
nisso antes?
Mas já era tarde demais. Eu já estava ali. Você já
estava ali.
Meu próximo passo foi chorar... de desespero mesmo.
Eu não queria viver aquilo agora. Eu não queria ter que encontrar com você em
uma festa. Eu não me preparei psicologicamente pra isso. Era cedo demais. E eu
não podia mais fazer nada. Não podia mais evitar. Eu não tinha mais como
controlar isso. Nós estávamos juntos. Naquela cidade...e mais tarde naquele
show.
Foi uma difícil decisão, porque eu queria mesmo
ficar em casa naquele dia. Não me importava se tinha ido ali pra festa... Não estava me importando com isso. O fato de
poder ver você de novo tava doendo de verdade e meu coração tava apertado. Tudo
poderia acontecer. E eu não estava preparada. Mas pensei que nunca vou estar
pronta pra isso. Pensei que mais cedo ou mais tarde isso iria acontecer.
Querendo ou não o mundo é muito pequeno e apesar de estarmos tão longe um do
outro, o acaso ou o destino (seja lá o que fosse) iria nos colocar no mesmo
lugar.
E colocou.